Viajei: SOCORRO — São Paulo-SP 2024: Voo de ida e volta
Mais um relato de viagem! Vem comigo? Desta vez o itinerário é Salvador–São Paulo.
Véspera da viagem
Ainda impactado com o acidente da VOEPASS, me preparei para entrar em um avião pela terceira vez em dez dias (antes teve a viagem para Brasília, cujo relato você pode ler aqui).
Estava super animado para ver vários amigos e estar em família em São Paulo. Será que certos tipos de viagem nos deixam menos ansiosos? Um voo a trabalho perturba mais um panicado? Bem, o fato é que, na antevéspera da ida eu estava bem relaxado, zero nervosismo. Até achei estranho. Talvez estar me tornando um passageiro mais frequente esteja me deixando calejado. Refletindo sobre o assunto, me passa pela cabeça as aulas de alemão (cursei três semestres antes da pandemia). O primeiro dia foi meio aterrorizante. Mas no fim do primeiro livro eu já sabia algumas coisinhas e me sentia menos tenso. Talvez a prática sirva pra isso, para nos deixar mais seguros.
Mas a teoria caiu por terra na véspera, quando liguei para minha mãe. Ela me disse que vinha tendo uma série de pesadelos, sem revelar o conteúdo dos sonhos ruins. Seria um mau presságio, pensei? A boca ficou seca na mesma hora.
Na noite anterior ao voo, caprichei na melatonina, para ajudar a dormir. Apaguei a luz e fiquei pensando, no escuro: excesso de melatonina causa overdose? Será que vou morrer? Acho que cheguei a puxar o celular do carregador para pesquisar na internet, mas nem me lembro da resposta. O fato é que eu cai no sono e não morri (como dizem, “não acordei morto” — adoro essa expressão mórbida). Estranhamente, nos preparativos finais para sair de casa, eu estava me sentindo só um pouquinho nervoso, talvez efeito das gotinhas a mais que tomei antes de dormir. Salvador ainda estava quieta. Tinha de estar às 5h no aeroporto. Amo. Cidade calma, sem estresse e engarrafamentos. O caos afeta demais minha aerofobia.
Pois infelizmente a calmaria não foi o que encontrei no embarque. A GOL volta e meia apronta essa. Vende a opção de embarque prioritário, mas não coloca direito as plaquinhas para organizar as filas e vira tudo uma grande confusão humana. É um serviço pago! Eu compro pois me sinto menos tenso ao embarcar logo e me sentar na minha nova cadeira queridinha do momento (a 1D, na primeira fileira). Já não basta ter como destino Congonhas, o terror de dez entre dez panicados? É preciso uma dose extra de adrenalina?
Por falar em assento, tenho achado o 1D ótimo pois ele oferece uma visão privilegiada…das comissárias de bordo (calma, profissionalmente falando). É sempre um alento, em momentos de turbulência, vê-las sentadinhas conversando de boas, sem cara de terror. Sinal de que está tudo OK.
Mas já estou eu aqui falando de turbulência sendo que no meu relato o avião nem decolou! É que foi tenso.
Indo para SÃO PAULO
Toda vez eu filmo o momento em que entro no avião, sempre falando “pé direito sempre”. Só que dessa vez, bem na hora, apareceu o aviso na tela do celular de “sem espaço de armazenamento” (meu aparelho é meio velhinho já). Claro que fiquei todo nervoso pois a tradição foi quebrada. E nem me considero supersticioso! Juro que por um segundo pensei em desembarcar. Mas resolvi seguir em frente. Pra piorar, a decolagem foi bem bizarra, depois que os pneus saíram do chão houve muito remelexo, não foi uma subida tranquila. O joguinho do ABC foi um ótimo meio para focar a atenção e esquecer um pouco o momento que mais me dá pânico (se não conhece essa brincadeira para tirar a atenção do medo — clica aqui). A decolagem me deixa exausto, sei lá, acho que respiro mal, o coração bate acelerado. Só sei que quando chega na altitude de cruzeiro eu estou sempre esgotado, parece que o corpo correu uma maratona.
Nesse voo, as redes sociais funcionaram super bem, ao contrário da volta de Brasília, na semana anterior. Acho ótimo para distrair, ficar falando amenidades com amigos. Filmes e séries eu não consigo assistir, muito menor ler livros: a mente não consegue focar em nada direito. Então o Whatsapp é meu “app-astor” e nada me faltará (só a tranquilidade proporcionada pelo solo).
Nesse voo, apesar do sol invernal nordestino das 7h já estar bombando do lado de fora, a tripulação pediu que os passageiros sentados nas janelas deixassem as persianas fechadas. Amo isso, fica aquele escurinho, aquele clima geladinho, gostoso. Quem não estava muito calmo foi um bebê com os responsáveis na primeira fileira, só que do outro lado do corredor. Ela estava sendo apenas criança pequena, com direito a choro, é claro. Confesso que já fui desses que se incomodam com bebês (nunca falei nada, por motivos óbvios). Mas hoje estou mais terapeutizado e entendo que não tem motivo para se chatear com um bebê que não sabe nem dizer que está com fome. E os responsáveis pareciam ótimos, levaram vários brinquedinhos, passearam pela cabine, até deixaram o pequenino em cima de uma coberta no chão — sobre esse último ponto já não sei o quão seguro ele é, afinal turbulências severas podem ocorrer de uma hora pra outra, por isso a importância de manter o cinto de segurança afivelado durante todo o voo.
Entre um cochilo (baba? Ronco? Talvez) e outro (obrigado, remedinho que tira a ansiedade e dá sono), logo era a hora do pouso. Chegar em Congonhas é sempre tenso, não é mesmo? Ver os prédios pela janela cada vez mais perto, os carros cada vez maiores. Para piorar, o moço do meu lado começou a ler o cartão com instruções de emergência bem nessa hora! Fiquei com uma pulga atrás da orelha. Naquele momentos, meus planos incluíam sair dali comodamente pelo finger, não pulando em um tobogã inflável.
Pousamos. Aos solavancos, mas pousamos (achei até que o avião ia dar um 360 graus).
VOLTANDO PARA SALVADOR
Os dias foram passando, todos ótimos. Até a véspera do voo de volta.
Voltei a Salvador no domingo. Pois no sábado fui na casa de um amigo baiano que mora em São Paulo comemorar o aniversário dele. Lá pelas tantas, do mais absoluto nada, bateu uma aflição. É claro que eu sabia que em menos de 24h estaria embarcando novamente, mas foi como se eu só estivesse me dando conta daquilo naquele momento. Fui ficando verde, amarelo, cor de rosa, toda a aquarela. Entrei sobressaltado no uber para voltar para o apartamento que eu e minha família alugamos. Suava frio. Dormi sobressaltado.
Amanheceu o dia. Ainda na cama, li a mensagem de que um primo querido iria ser operado na cabeça por conta do tumor que já o assusta há mais de dez anos. Pra piorar, ele mora na Itália, então nem posso fazer uma visita. Fico pensando em como a vida é uma batalha para todos e que a morte, de fato, é mesmo a única certeza. De uma maneira estranha, me peguei me sentindo com menos medo de voar. Pois o meu medo é o do fim. Mas qual o motivo de temer algo que chegará, invariavelmente, para todos?
Mensagem de meu marido no celular: “Te amo”. Seria isso uma despedida? A mente entrou em parafuso. Fui pedir um uber para Congonhas. Vejo que a categoria Black está com um preço promocional bem interessante. Não pensei duas vezes e pedi. Que delicia ir já relaxando no carro. Chegando no destino, fui gravar um stories pro rivotravel e vi sem querer uma notícia sobre as investigações do acidente da VOEPASS. Socorro!
Enquanto esperava perto da porta de embarque, fiquei prestando atenção nos pousos e decolagens. Quem já passou por este aeroporto sabe que a pista é bem perto da sala envidraçada onde os passageiros aguardam para entrar no avião. Não gosto disso, me deixa ansioso. Ver as aeronaves correndo para subir ou freando bruscamente para parar me deixa ainda mais panicado. Pouco depois, ouvi um anúncio pelo sistema de som: “voo com destino a Congonhas”. Dei risada. Mas logo em seguida surgiu uma pequena paranoia, pois qualquer mínimo erro ligado à aviação já me deixa com um pé atrás. Na mesma hora, uma amiga me mandou um vídeo. Pela foto, suspeitei ser algo ligado ao acidente aéreo ocorrido semanas antes. Decidi nem abrir a mensagem para conferir. Seguro morreu de velho. Morreu? Morte! Toc, toc, toc na madeira.
Mais caos no embarque. Voo cheio. Muitas filas. Já na porta do avião, vi uma moça mandando para dentro um remedinho. Reconheci na mesma hora aquela cartela e aqueles comprimidos. “Oi, colega de pânico”, pensei. Pena que não tenho cartões de visita do rivotravel. Lá dentro, o caos continuou. Quase ninguém parece ter aderido ao despacho gratuito de bagagens (é possível fazer isso sem custo no balcão do check in). “Hoje tá difícil”, escuto uma comissária falando para a outra. Já liguei o modo alerta. Momentos depois, a porta da cabine de comando é aberta. E esse é o lado ruim de sentar na 1D, pelo menos na minha opinião. Fico agoniado ao ver “o lugar onde tudo acontece”. Prefiro crer inconscientemente que fadinhas etéreas sustentam os aviões longe da terra e os guiam pelos ares.
Decolagem? Super tensa, para variar. Mas dessa vez, já lá em cima, lembrei que trouxe na mochila o tapa-olhos e os tampões de ouvido. Coloquei e dormi por meia hora. Vitória.
No desembarque, meu marido estava me esperando. Não sei o motivo, mas ele achou uma ótima ideia me levar grogue de remédio para um shopping. Pois lá tive um momento epifânico: “que viagem, estou aqui em Salvador, distante milhares de quilômetros de onde eu estava duas horas atrás. Isso é muito louco”.
OK, foi uma epifania pequena e óbvia, mas no momento me pareceu extremamente profundo, tanto é que anotei para não me esquecer.
* * *
E com essa eu termino a matéria, com o desejo que a gente consiga viajar mais e mais.