Sem motor, sem neurose — tudo conspira para nossa segurança durante os voos, até quando o motor falha!

Meu pai me contava que, certa vez, em uma das constantes idas ao aeroporto de Salvador na minha infância, eu perguntei: “pai, o que acontece se um avião perder um motor?’ (assim mesmo, como se fosse do feitio das aeronaves ir perdendo motores por aí). Meu pai, não sei se por conhecimento técnico ou apenas para saciar minha curiosidade infantil, respondeu: “não se preocupe, ele voa com o que ficou”. E é isso mesmo! Os aviões são projetados para voar com apenas um motor funcionando, sem problemas. 

 
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E foi isso que aconteceu hoje, com um voo de um Boeing 777-200 da Japan Airlines que ia de Okinawa para Tóquio, com 178 passageiros e 11 tripulantes. Durante o voo, um pedaço da nacele se soltou (nacele é uma designação normalmente dada ao suporte do motor nas aeronaves em que é fixado na asa). O motor esquerdo falhou e logo em seguida houve um forte barulho e tremores na aeronave que assustaram os passageiros — não é para menos, não é mesmo? Por muito menos eu já estaria em completo pânico.

Um dos viajantes disse ao jornal japonês Ryuku Shimpo que “cerca de 10 minutos após a decolagem, quando acabamos de sair das nuvens e vimos o céu azul, uma explosão repentina soou e uma coluna de fogo saiu da asa esquerda”. O The Aviation Herald, site especializado em aviação, reportou que os pilotos desligaram o motor defeituoso e solicitaram um retorno de emergência a Okinawa. O pouso foi feito 35 minutos após a partida, de forma segura. Os bombeiros estavam ao lado da pista, mas não foram acionados. O Ministério dos Transportes do Japão classificou a ocorrência como um incidente sério. 

 
(Crédito: Ryukyushimpo)

(Crédito: Ryukyushimpo)

 

O caso japonês de hoje foi pura sorte? Nada disso! Não vamos desprezar todo o trabalho dos engenheiros e engenheiras aeroespaciais. O fantástico Lito, do site Aviões e Músicas, atesta: não há nada de mais em voar com um só motor. Nesses casos, “o outro motor fará um pouco mais de força e manterá o avião voando. Claro que não é operacional ficar voando monomotor em um bimotor, então quando isso ocorre o piloto deve procurar um lugar para pousar e ter o problema resolvido”. E por quanto tempo um avião pode voar com apenas um dos motores? Depende de cada modelo. Um Boeing 767 por exemplo geralmente é homologado para poder voar por até três horas de distância de um aeroporto que possa pousar caso tenha problema em um motor. Algumas aeronaves possuem a homologação para 120 minutos e outros para 70 minutos. Seja qual for o caso, é tempo mais que suficiente para encontrar um aeroporto para um pouso não-programado.

E se os dois motores falharem? Não é motivo para entrar em pânico (sei que deve ser difícil em uma hora dessas, mas a física está do nosso lado). Quem continua explicando é Lito. “Aqui entra um conceito que se chama “razão de planeio” e todo avião possui um índice de planeio baseado no projeto de sua asa (high aspect ratio). O Boeing 737-800, por exemplo, possui uma razão de planeio de aproximadamente 18:1, ou seja, para cada metro de altitude perdida, ele se desloca 18 metros para frente. Se você levar em conta que a altitude de cruzeiro (na qual o avião viaja) chega a 12 mil metros, se um 737 perder seus dois motores em cruzeiro ainda permanecerá voando por 216 quilômetros se nenhuma ação for tomada”.

Curiosamente, os dois textos que já fiz para a série Histórias de acidentes não-fatais e o que eles têm a nos ensinar envolvem voos que tiveram perda de potência nos motores e planaram. Vale a pena relembrar, os links estão logo abaixo — o #01 é o acidente do voo da British Airways 9 (em 1982) e o #02 é o do Air Transat 236 (em 2001) . Mas sempre destacando: esses acidentes são super raros, e quando acontecem não configuram necessariamente em um prelúdio de um acidente catastrófico.  Sei que a ideia de ficar em um avião com apenas um motor funcionando ou sem motores é terrível, mas a engenharia e a física estão ao nosso lado. 

 
 
Rivo, AviaçãorivotravelComment