Mais um ano, menos um medo

Entra ano, sai ano, e uma coisa não muda: vai chegando perto do meu aniversário (completo 43 anos depois de amanhã), e fico mais reflexivo sobre as mudanças que ocorreram no meu último “ciclo” de vida. A terapia tem me ajudado bastante a revolver um monte de minhocas que tinha na cabeça, apesar de ainda ter outras tantas na cachola. Tem me auxiliado, inclusive, a voar mais e melhor! Mas vamos com calma com isso, vamos “organizar as caixas”.

 
 

Eu gosto muito do meu aniversário. Tem gente que fica em casa, não atende telefonemas (alguém ainda atende?), fica de mau humor quando dão os parabéns e por aí vai. Eu não sou assim. Não fico cobrando ninguém, não fico achando ruim se um ou outro amigo não lembrou ou não mandou mensagem, mas amo quem tira um tempinho para me desejar coisas boas — ou me trazer um mimo alimentício. E, em 2024, o dia 29 de novembro cai numa sexta-feira, ou seja, dia de terapia! Como estou tentando ser mais organizado, sempre levo no celular os tópicos que quero abordar na sessão. Que a festa comece!

Em 2024, acho que tive uma clareza maior sobre alguns dos meus medos. Não só o pavor de voar, mas também outros, que podem estar relacionados à aerofobia, inclusive. Resolvi parte deles, é verdade, e outros eu espero resolver ao longo da minha jornada analítica, no futuro. Esse processo é uma mistura de querer olhar para dentro de si e de poder bancar isso, afinal, a situação financeira não está fácil para ninguém. Quem tem acompanhamento de um profissional como eu sabe como é bom ir “desatando os nós”, apesar dos (poucos) momentos angustiantes.

Abordei com minha psicóloga, em alguns momentos, o meu pavor de aviões. Inclusive, dediquei uma sessão inteirinha para detalhar como tudo começou (que você pode ler aqui): de que forma estar dentro de uma aeronave afeta minha já conturbada mente e quais as possíveis conexões com minha história de vida. Em resumo, o motivo pelo qual eu sinto o que sinto. Encontrei a solução? Claro que não. Mas, mexendo no meu passado, fui encontrando algumas respostas.

 
 

A verdade é que ainda sinto muito pânico, e só de pensar em viajar já fico aflito, mesmo sabendo que tenho o auxílio de meu precioso remedinho. Em 2024, voei um bocado. E, no Natal deste ano, tenho mais uma viagem aérea para o interior de São Paulo, para passar a data em família. Ainda bem que meu marido vai, pois saber que ele está ao meu lado facilita muito as coisas (nem que seja para segurar a mochila, porque carregá-la meio grogue é dureza). Como já disse, acho que meu medo de voar melhorou um pouquinho, mas, dia desses, estava pensando nos próximos voos e fiquei com as mãos suadas. Sinal de que não cavei o suficiente na terapia. Será que chegará logo o dia de encontrar, lá no fundo de minha alma, as razões desse meu temor? Isso eu não sei. O fundamental é que estou tentando com afinco, mesmo sem ter o mapa da saída nas mãos.

Lembrei agora da frase do poeta Antônio Machado: “Caminhante, não há caminho. O caminho se faz ao caminhar.” Nesse caso, a trilha que estou abrindo com as próprias mãos envolve psicanálise. Sou do time que acredita na máxima “todo mundo só tem a ganhar fazendo terapia”. É dolorido, mas pode ser reconfortante. Descobrimos traumas que não tínhamos consciência e que nos afetam cotidianamente.

Dentre as razões de minha aerofobia estão coisas íntimas demais para contar aqui. Mas outras são mais tranquilas de serem compartilhadas, como, por exemplo, meu medo de perder o controle. E nesses sete anos de rivotravel, descobri que muita gente também sente isso. Estar no comando daquilo que acontece em nossas vidas é uma ilusão, né? Mas nem sempre nos lembramos disso. Temos a ideia de que ser bem-sucedido naquilo que queremos para nós mesmos passa por controlar cada mínimo aspecto do dia a dia. E, quando embarcamos em um avião, somos forçados a entregar as decisões vitais a alguém que não conhecemos e sequer vemos, pois esse “timoneiro de nossas existências” fica escondido lá na cabine de comando — inclusive este excelente termo “comando” vem bem a calhar, não? Afinal, eles guiam nossas vidas pelo tempo que durar o voo.

E qual o motivo que me leva a temer um avião, mas relaxar em viagens de carro ou ônibus, meios de transporte muito mais perigosos, de acordo com as estatísticas? Freud e minha terapeuta explicam. Nota mental: trabalhar mais sobre isso na sexta-feira.

Mas resolver, mesmo que minimamente, o meu medo de voar já é maravilhoso! Sei que, na verdade, sou do time pessimista que vê o copo sempre meio vazio, mas no quesito aerofobia só tenho a comemorar. Sinto que, nas viagens que fiz em 2024, fiquei um pouquinho menos tenso nos momentos que antecedem o embarque e a decolagem — que, para mim, são os piores, mesmo com o efeito das medicações. Tenho a impressão de que, quanto mais tenho viajado, menos pavor tenho sentido.

Lembrei agora de um filme (que não vi) chamado FilmeFobia, do diretor brasileiro Kiko Goifman. Segundo a revista Rolling Stone Brasil, a obra dá um nó entre ficção e documentário e pergunta: você tem medo de quê? FilmeFobia coloca as pessoas em cena em confronto com suas maiores fobias, desde as mais “óbvias” até aquelas mais curiosas, como pavor de botão de roupa ou de ralo de banheiro. Será que se expor àquilo que nos aflige ajuda a diminuir a força da situação traumática? Infelizmente, o longa-metragem não está disponível em serviços de streaming, então não tenho como acessá-lo. A incógnita fica no ar.

Antigamente, deixar uma matéria sem uma aparente conclusão me faria pensar que sou um mau jornalista. Mas o novo Salvatore, um pouco mais terapeutizado, diz a si mesmo: não tenho controle de tudo. E assim é o caminho da vida.

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