Doses curtas #02
Eu, em um voo de X para Y (e quem se lembra a rota?). Entro cambaleando, quase me arrastando pelas paredes do finger — aquela ponte sanfonada que liga o terminal ao avião. Por um milagre de Santos Dumont (Santo mesmo!) consigo achar minha poltrona. A aeromoça, percebendo o estado decrépito da criatura, se aproxima para assuntar (uma das funções dos comissários é a de mapear possíveis passageiros problemáticos).
Ela: “Olá, senhor, como vai? Tudo bem com o senhor? O senhor ingeriu bebida alcoólica antes de embarcar?”.
Eu: “Não, não. Estou só drogado mesmo”.
Péssima. PÉSSIMA escolha de palavras.
Voo maravilhoso. Salvador–Congonhas. Consegui me arrastar até minha poltrona e apaguei. Acordei quando já estava rolando o desembarque. Detalhe: minha poltrona era no corredor. E tenho a vaga memória de alguém pulando minhas imensas pernas para sair da fileira. Dane-se. O voo foi maravilhoso. Bitch, don’t kill my vibe.
Sabe a expressão “se cagar de medo”? Não, não borrei as calças. Por pouco. Estava indo para Belo Horizonte para o casamento de um amigo (por que amigos não casam em suas cidades de origem?). Avião decola e começa aquele ensaio geral da Mangueira dentro de mim. Estava viajando com uma amiga e “segura o assunto aí que já volto, miga”. Acontece que eu não voltei. Fui pro banheiro e fui ficando, ficando. Acontece que avião não é aquela coisa de uma infinidade de banheiros disponíveis aos usuários — aliás, acho que, se as companhias aéreas pudessem, tirariam os banheiros para colocar mais assentos. E eis que uma aeromoça muito da FDP ABRE a porta do banheiro (sim, agora eu sei que é possível abrir a porta por fora). Eu, me contorcendo, ainda tive a sutileza de dizer um “pois não?”, antes de ver a cara da coitada fechando a porta. O que ela queria, afinal? Ver se eu estava vivo? Me apressar? Acho que funcionou, porque, com o susto, travou tudo! Viajar com dor de barriga é uma merda. Ainda mais que o voo teve conexão em Brasília.