Centenário da companhia aérea mais antiga do mundo (quem terá sido o primeiro panicado da história?)
A Koninklijke Luchtvaart Maatschappij (em português: Companhia Real de Aviação) completou essa semana seu primeiro centenário (de muitos, assim espero, pois parece ser uma querida). Não está ligando o nome à pessoa? É a KLM, gente! Quem ama aviação como eu certamente conhece a empresa, que é a mais antiga do mundo ainda em operação. O voo inaugural aconteceu só no ano seguinte, em 1920, levando dois jornalistas ingleses na rota entre Londres e Amsterdã (meu Deus, eles ainda por cima passaram por cima do mar!) em um De Havilland DH-16, um antigo avião bombardeiro que foi de fato usado na Primeira Guerra Mundial (1914—1918). O espaço era tão pequeno que os pioneiros eram transportados onde antes ficava o atirador. Será que eles sentiram medo?
Como dá para ver na foto abaixo, a “cabine” era aberta, obrigando o piloto e os passageiros a usar pesados casacos de couro para suportar o frio. Por conta do oxigênio escasso em altas altitudes, o voo não “subia muito”. Agora me digam: vocês conseguem se imaginar dentro dessa belezura? Ainda bem que o primeiro voo comercial da KLM não se transformou no primeiro acidente da história da aviação comercial. Sinal de que voar não deve ser tão terrível assim. Louvados sejam os avanços da indústria aeroespacial.
A Koninklijke Luchtvaart Maatschappij (não faço ideia de como é a pronúncia, ainda bem que tem a sigla para nos salvar) foi fundada pelo piloto militar Albert Plesman (1889—1953), que na época tinha 30 anos e que permaneceu à frente da empresa até a morte. O “real” da sigla foi “emprestado” pela Rainha Guilhermina (1880—1962) em um esquema de concessão de uso que até hoje dura períodos de 25 anos. A última “renovação” foi em 2012. Em 1919, quando a KLM foi fundada, a rainha quebrou a tradição: até aquela data, uma empresa, para ter o direito de ostentar o “real” em seu nome, deveria ter pelo menos 100 anos. Ou seja, se fosse seguir o protocolo, a companhia aérea de bandeira dos países baixos se tornaria “real” somente agora em 2019. A coroa, por sinal, é o símbolo máximo desde o primeiro ano da KLM e é facilmente reconhecida pelos amantes da aviação comercial. A atual versão estilizada que faz parte da pintura da fuselagem e da identidade visual foi adotada em 1964 e permanece simples e contemporânea: uma barra na horizontal, quatro bolas em cima, enfileiradas, e uma cruz no topo.
Eu ainda não tive o prazer de voar na KLM, que no Brasil há décadas serve o Rio de Janeiro e São Paulo, utilizando, atualmente, os Boeing 787 e 777, respectivamente. E quando eu falo em décadas não é força de expressão. O primeiro voo para o país foi em 1946, há 73 anos. O DC-4 saiu da capital holandesa com 44 passageiros e fez escalas em Lisboa e Dakar (Senegal), cruzou o Atlântico e parou em Natal antes de prosseguir para as capitais fluminense e paulista. Depois prosseguiu viagem para Buenos Aires. A viagem toda levava três dias e meio para ser concluída. Olhando a foto do DC-4 dá para ver o enorme avanço quando comparado ao De Havilland de 1920 — mesmo assim eu tremeria de medo de entrar nesse bicho, ainda mais por tanto tempo. Hoje, um voo entre as duas maiores cidades brasileiras e a Holanda dura, em média, 12 horas. Ainda bem!
Em 2018, a empresa lançou a rota Fortaleza — Amsterdã, aumentando assim as opções para quem mora no Nordeste/Norte do Brasil e quer ir à Europa (não precisando, assim, ter de descer atéééé o sudeste para pegar uma conexão). Por aqui, a holandesa tem acordo com a Gol, oferecendo assim uma grande oferta de destinos nacionais aos passageiros da KLM. Eu acho a empresa muito fofa (digo, a fuselagem, pois ainda não tive o prazer de viajar com ela). A pintura é linda, sóbria, elegante, com esse azul lindo, lindo, como na foto abaixo. A empresa é tida como muito boa entre os brasileiros, mesmo aqueles que, assim como eu, viajam na econômica. No Skytrax, o Oscar da aviação comercial, ela leva quatro estrelas (de um máximo de cinco), junto a companhias como a Air France (ambas fazem parte do mesmo grupo controlador; a junção ocorreu em 2004).
Os números da KLM impressionam. Foram transportados, em 2018, 34,1 milhões de passageiros. Só para comparar, em 1920, primeiro ano de operações regulares, foram apenas 345 passageiros (mal daria para encher, hoje, um Boeing 747). O primeiro voo transatlântico foi só em 1934, para Curaçao, nas Antilhas Holandesas (Caribe). Em 1961, ela começou a usar jatos em suas rotas, com a introdução do DC-8 na frota, que revolucionou as viagens. A companhia está sempre ligada à inovação. Em 1999, foi a primeira empresa aérea a receber o certificado ISO 14001, por seu sistema de proteção ambiental. Uma prova disso é que, em 2011, ela foi a pioneira também no uso de bioquerosene, menos poluente. Parte de sua composição vem de óleo de cozinha que já foi usado e descartado. Eu acho isso impressionante. A IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo) estipulou uma meta de reduzir em 50% as emissões de carbono na atmosfera até 2050.
Para marcar o centenário, foi realizada uma grande festa em um dos hangares da companhia no aeroporto Schiphol, na capital holandesa. “O fato de celebrarmos nosso centésimo aniversário não é apenas um testemunho de um século de uma empresa, inovação e comércio bem-sucedidos, mas também da fé que os clientes e parceiros têm na gente. É uma homenagem aos pioneiros da aviação da KLM, que literalmente colocaram a aviação civil no mapa em todo o mundo”, disse o CEO Peter Elbers, citado pelo site Melhores Destinos.
Uma coisa que eu noto é uma forte presença nas redes sociais, pelo menos aqui no Brasil. O aplicativo para smartphones também é bem completo e permite ao passageiro fazer check-in, download de cartão de embarque, marcação de poltrona e compra de bagagem extra. Além disso, a KLM está investindo, nos últimos anos, em tecnologia para melhorar e experiência nos aeroportos no futuro, por meio de robôs que fornecem dados dos voos, informações importantes e até mesmo carregam a mala de mão e guiam os clientes até o portão de embarque. Uma baita ajuda em tempo de terminais enormes e cada vez mais lotados. Tomara que vire realidade logo.
E em junho deste ano, a empresa anunciou investimento financeiro no projeto de um avião completamente inovador desenvolvido por estudantes da Delft University of Technology —nós até postamos em nosso Instagram, no dia do anúncio, uma foto do protótipo, mas vocês, panicadas e panicados, ficaram com certo medo só de ver a imagem. Se sair mesmo dos programas de computador, o modelo, batizado por enquanto de Flying-V (por conta de seu formato que lembra a letra do alfabeto) levará passageiros e cargas na asa! Na verdade, a ideia é um grande par de asas voadoras e poderá representar uma economia de até 20% de combustível em comparação com seu concorrente direto, o Airbus A350, gerando assim menos poluição. Mas, se virar realidade, o Flying-V só deverá ser visto nos céus em 2040. Talvez, quando eu for velhinho, vá olhar para trás e achar que o voo entre São Paulo ou Rio e Amsterdã em 2019 era extremamente lento, assim como hoje não acreditamos que, em 1946, o mesmo trecho levava dias.
Feliz aniversário, minha senhora centenária e antenada querida! Ou melhor: Fijne Verjaardag!