E se esse nosso medo nunca for embora?
E se? E se a pergunta que eu faço no título deste texto se concretizar? Se o meu pavor de avião nunca me abandonar, grudar em mim e não me deixar jamais, nem com reza braba? Muita gente sabe como e quando o próprio medo começou (o meu caso, inclusive, pode ser lido aqui). Uma turbulência mais forte. Uma maternidade (sim, muitos casos de mulheres que começam a ter medo de voar quando passam pela experiencia da maternidade, como também pode ser lido aqui). Um mau pressentimento. Uma vidente. Os motivos para a instalação da aerofobia em nossos hardware cerebrais são muitos. E quais são os caminhos que levam ao fim definitivo dele? Terapia? Viagem (de avião, droga) à Índia para um retiro de autoconhecimento? O dedo de Deus?
E se nada disso der certo? E se a pessoa simplesmente não quiser ou não puder pagar um acompanhamento terapêutico? Ou até mesmo se ela quiser e puder, mas com resultado nulo? É entregar os pontos? Não viajar mais? Muita gente escreve pro rivotravel falando coisas do tipo : “ah, quando eu vencer meu pânico vou aproveitar tanto”. E tome-lhe planos: uma segunda lua de mel — às vezes a primeira é adiada justamente pelo medo —, uma viagem sozinha pela Ásia, um curso de inglês nos EUA. Tudo pegando avião. “Quando eu não mais temer um voo, vou fazer tanta coisa”.
E será que não dá para fazer tudo isso mesmo se borrando de medo? Não dá para ir para a lua de mel agarrada ao braço do marido ou esposa, se tremendo que nem vara verde? É óbvio que seria melhor se fosse diferente. Mas paciência. Será que vaie a pena não fazer a viagem dos sonhos por conta de umas horas sofrendo (ok, algumas muitas horas)?
Lógico que estou falando de casos leves e moderados de aerofobia: pessoas que, assim como eu, se agoniam por completo, roem as unhas, prendem a respiração, suam, mas conseguem embarcar (com a ajudinha de um remédio) e voam. Há casos crônicos, nos quais a pessoa não consegue sequer pensar na possibilidade de botar um pé em uma aeronave, muito menos sentar na poltrona e aguardar a decolagem. Não é desses casos que estou falando, bom deixar claro.
Por que não normalizamos um pouco esse sofrimento? Comprar a passagem passando mal? Tudo certo. Ficar sem dormir na véspera da viagem? Tudo bem, quando chegar ao destino dá para recuperar as horas de sono perdidas. Sudorese intensa na ida ao aeroporto? Só caprichar no desodorante. Dor de barriga? É só lembrar de fazer refeições bem leves nos dias anteriores, o básico dueto franguinho grelhado com salada — e em último caso há muitos banheiros nos aeroportos e no avião. E por aí vai. Encontrar saídas para as situações de estresse. Eu mesmo já descobri um jeitinho de driblar o que, para mim, é o pior momento: a decolagem. Encosto a cabeça na poltrona da frente e com as duas mãos eu tapo a lateral do rosto, como se fosse criar uma “cabaninha” (que é como eu chamo). Ali eu me imagino, pequenino, sentadinho naquele espaço de segurança, onde nada pode acontecer. Funciona! Cada um encontra sua melhor forma de driblar o danado do medo: ouvir músicas relaxantes, levar livrinhos para pintar (estavam na moda até um dia desses), assistir a filmes de comédia. Encontre a sua! Teste várias formas até encontrar a ideal.
Em resumo, acho que o cerne da questão é: devemos bolar uma forma só nossa de conviver com nossos medos, com nossas limitações. Lembrei agora de uma ilustração fofa que uma vez vi na internet: uma moça com transtorno bipolar oferecendo chá para o “fantasma” dela (a doença que ela não conseguia vencer, mas conseguia controlar). Afinal, se o medo de voar não passar nunca, se ele comprou uma passagem vitalícia para habitar em nós, vamos ficar toda a vida sem viajar? Perder tantas oportunidades, de trabalho e de lazer?
Porque, é como dizem: está no inferno? Então abrace o capeta. Não tem como vencer o monstro? Busque ser amiguinha ou amiguinho dele.
E como dizia minha saudosa irmã, “desencana que a vida engana”.