Aviões supersônicos: voar duas vezes mais rápido traz alegria ou tristeza aos panicados?

Na última semana, uma notícia causou frisson (amo essa palavra) no mundo da aviação: a companhia aérea norte-americana United anunciou a encomenda de 50 aviões supersônicos da empresa Boom (na verdade a compra de 15 unidades seguida da intenção de adquirir mais 35 delas caso todos os requisitos sejam cumpridos pela fabricante). Seria a “volta do Concorde”, um avião icônico cujo projeto dos anos 1960 se tornou obsoleto até seu fim trágico, no início dos anos 2000? Pois a notícia foi tão surpreendente que eu até achei que fosse fake news, mas fui pesquisar e vi vários sites jornalísticos sérios, como o da Forbes, publicando a notícia. E o que essa novidade tem a ver com os panicados? Antes, vamos explicar mais sobre o projeto.

 
 

O prazo para entrega do primeiro avião, cujo nome inicial é Overture, é 2029. Um avião comercial “normal” viaja a uma velocidade média de aproximadamente 900 quilômetros por hora. O supersônico da Boom deve dobrar esse patamar. Ele viajará acima da velocidade do som, que é de 1.238 quilômetros por hora. Uma curiosidade: o “Boom” do nome da empresa é uma referencia ao barulho feito na hora que o avião “quebra” a barreira do som. O avião está sendo projetado com materiais compósitos, que prometem reduzir o peso e o consumo das aeronaves modernas. Além disso, deve usar combustível de aviação sustentável (SAF), uma vitória dos ambientalistas. O trecho São Francisco–Tóquio deve levar menos de seis horas de duração.

 
Projeção de como será o Overture com a pintura da empresa aérea United, que já confirmou a compra de 15 unidades do avião supersônico

Projeção de como será o Overture com a pintura da empresa aérea United, que já confirmou a compra de 15 unidades do avião supersônico

 

A expectativa é que cada unidade custe cerca de 200 milhões de dólares. Parece muito, mas é até pouco perto de outros aviões, como os da Boeing. Mas é preciso levar em consideração que o Overture está sendo projetado para levar até 88 passageiros, enquanto um 747 leva em média 500 passageiros. Isso, certamente, deve aumentar o custo da passagem. O novo supersônico deve voar a uma altitude de 60 mil pés, contra uma média de 36 mil pés dos jatos convencionais. Isso deve garantir um voo mais tranquilo, livre de grandes turbulências. E o céu? Nessa altura, se o passageiro olhar pela janela verá parte do céu escuro, um pouco como os astronautas veem. E será também possível ver a curvatura da Terra (um pouco de pânico disso, confesso). As janelas, por sinal, serão um show , bem grandes, ao contrário das minúsculas oferecidas no Concorde. Apesar de tantos avanços tecnológicos em termos de uso de materiais, é possível notar uma grande semelhança entre o Concorde e o Overture, como a forma delgada e aerodinâmica.

 
Olha o tamanho dessa janela! O Concorde, com suas janelinhas minúsculas, certamente iria chorar de inveja

Olha o tamanho dessa janela! O Concorde, com suas janelinhas minúsculas, certamente iria chorar de inveja

 
 
Avião delgado dá nisso: nada de vizinho de poltrona. Melhor ainda, não precisa lutar com o cotovelo por um espaço no apoio de braço

Avião delgado dá nisso: nada de vizinho de poltrona. Melhor ainda, não precisa lutar com o cotovelo por um espaço no apoio de braço

 

Por falar no “primo famoso e pioneiro” do Overture, lembrei de alguns comentários de seguidores do rivotravel no instagram (aliás, já segue a gente lá? Estamos no @rivotravel). “Meu medo seria pior em um avião supersônico, especialmente por saber do acidente do Concorde”, disse Giovanna Sasaki. Graziela Silva corrobora: “Eu já tenho pânico normalmente de avião, mas aquele medo incontrolável que me faz chorar toda vez que o avião decola e pousa. Tento controlar, pois amo viajar e não posso permitir que o medo me impossibilite de fazer as coisas que gosto. Quando soube (desse novo projeto de avião supersônico) instantaneamente me veio em mente o acidente do Concorde e pensei que se eles deixaram de produzir lá atrás é porque a segurança era bem questionável”.

 
Foto do Concorde nas cores da Air France, uma das duas empresas que voaram com o modelo (a outra foi a British Airways)

Foto do Concorde nas cores da Air France, uma das duas empresas que voaram com o modelo (a outra foi a British Airways)

 

O Concorde de fato é mal visto por muita gente, especialmente os panicados. Mas é preciso dizer que, em suas quase três décadas de voo, houve apenas um acidente fatal com o supersônico. Mas isso ajudou a sepultar de vez sua trajetória, que não foi muito bem sucedida em termos comerciais. A “culpa” não foi bem do Concorde ou de seus pilotos no acidente, ocorrido em Paris no ano 2000. O fato é que, minutos antes da decolagem do Concorde, um DC-10 da Continental Airlines decolou na mesma pista e uma peça de titânio se soltou da fuselagem. Pois o Concorde, que estava logo em seguida, acertou com o pneu exatamente a pequena peça, que funcionou como uma navalha e estourou um dos pneus do avião da Air France. Detritos foram arremessados a uma velocidade enorme contra a asa, justamente onde ficam os tanques de combustível. Com o tanque cheio, o combustível começou a vazar. Mais azar: faíscas geradas por danos no sistema elétrico começaram a ser produzidas, gerando a queima do produto. O avião ficou desgovernado e caiu nas cercanias do aeroporto parisiense.

Mas muitas panicadas e panicados disseram que voariam, sim, em um avião supersônico. “Quanto menos tempo no ar melhor para mim. Também costumo pesquisar as aeronaves antes de fechar o bilhete de uma determinada companhia e quanto mais recente ou mais high tech, mais me sinto confortável. Então os supersônicos me parecem uma ótima ideia. Não sei se a viagem é desconfortável pela velocidade, se o passageiro sente algo. Mas aí já vou estar desconfortável mesmo (pelo medo de voar), aguento um pouco mais de desconforto, se tiver”, afirma Daniela Blumetti. A ideia é aplaudida por muita gente, como Luba Melo (“quanto mais rápido o avião, mais rápido passa o medo”), Kell Soares (“acho que voaria para chegar mais rápido. Mas só depois de muitos gente testar e o treco não cair”) e Mel Negreiros (“pelo menos chega mais rápido então o sofrimento é menor”).

Mas a resposta que mais sintetiza minha aflição com um avião supersônico é a de Ju Clorado: “pra que isso?”. Pois eu endosso a pergunta: pra que isso, minha gente? Morro de medo! Olha, não me importo de voar em um avião convencional, pois para mim a pior parte do medo é a decolagem. Então enquanto houver decolagem, medo terei. Voar a quase dois mil quilômetros por hora? Deus sabe disso? Tá de acordo (e olha que sou ateu)? Voar a 800, 900 quilômetros por hora já é demais para minha cabeça.

Socorro!