Autoconhecimento: o que aprendi na vida e no medo?

Hoje, dia 29 de novembro de 2023, é meu aniversário. Faço 42 anos. É a mesma idade que minha mãe tinha quando me teve. Datas assim, ainda mais no fim de ano, me fazem pensar muitas coisas. Vejo que aprendi algumas lições ultimamente, e muitas delas têm ligação com aerofobia. Vou listar algumas delas, procurando evitar o lugar de egotrip, que tanto odeio. E o de autoajuda também, claro. Mas como o rivotravel é, antes de mais nada, um lugar virtual para minhas experiências reais, não tenho muito como escapar dos relatos em primeira pessoa. E em fevereiro retomei a terapia, depois de 10 anos afastado dos consultório de psicólogos. Então cada passo é uma vitória e estou afiado na autoanálise.

 
 

Uma coisa que tento cada vez mais é me desvencilhar (e acho que tenho feito com êxito) da vergonha de assumir e expressar meus próprios medos e limitações. No supermercado, na casa de amigos ou em um avião. E, se for o caso, gritar em alto e bom tom aquilo que me aflige. Muita gente chega ao site dizendo ter vergonha de revelar que se treme todo ao embarcar em uma aeronave. Nesses casos, busco acolher a pessoa que está me confidenciando aquilo. Mas provoco: precisa ter vergonha? Por quê?

E isso acaba tendo ligação com outra coisa. Um fato que sempre busco dar especial atenção é o de ouvir as mulheres. Infelizmente, as vozes femininas muitas vezes são silenciadas em um universo ainda machista. Elas são maioria por aqui entre os leitores do site e no perfil do instagram. Dão depoimentos maravilhosos, engraçados, dramáticos, de superação e desequilíbrio, pois nem só de elevação vive a mulher. Não que não existam homens panicados. Mas eles têm vergonha de se abrir. É uma questão cultural e que eu abarquei em duas matérias da série O medo que os homens têm de ter medo (aqui o link da parte I e aqui o da parte II). Eu na verdade sempre fui rodeado de mulheres incríveis: mãe, quatro irmãs, tias, amigas. Depois vieram três sobrinhas maravilhosas, hoje já adultas. Homens, ouçam as mulheres. Ou, pelo menos, não as interrompam.

 

Ensaio realizado pelo fotógrafo André Souza para a série de matérias O medo que os homens têm de ter medo (modelo: Thiago Fernandes)

 

Ainda nessa seara, tenho aprendido a não me importar com o que os outros vão achar ou deixar de achar (tarefa dificílima essa…). E isso vale pra tudo, inclusive para a aerofobia. Já chorei de medo a 40 mil pés de altitude, já peguei na mão de estranhos, já abri o coração panicado para comissárias. Hoje em dia, faço a cabaninha sem ligar para o que o vizinho de poltrona vai pensar (conhecem a técnica da cabaninha (ou caverninha)? Explico na matéria E se esse nosso medo nunca for embora? e também na E aí, fez boa viagem #01. Faço minhas respirações, nem sempre tão zen e silenciosas. Tô nem aí. E em um voo em outubro, entre Milano e Lisboa, estava tão nervoso que fumei quatro cigarros seguidos (acendendo um no outro) naquela minúscula cabine esfumaçada dentro do aeroporto. Estava lotada de fumantes e percebi na cara de meus colegas de vício olhares de “meu amigo, você está bem?”. Não, não estava. E não era da conta de ninguém. Se vão vier para ajudar, não atrapalhe.

 

Cabaninha (ou caverninha) ajuda bastante nos momentos de tensão no voo

 

Mas é claro que muitos ajudam. Uma conversa para tirar a mente da paranoia do avião, uma frase de conforto, uma reza (para quem é religioso). Inúmeras são as formas da gente se ajudar. Eu tenho muita dificuldade, na vida, de aceitar que me auxiliem em algo. Que bobagem, não? Vivemos em sociedade e oferecer a mão ao próximo pode — e deve — ser a tônica da vida. Durante o voo, quando estou nervoso e vejo que os comissários não estão muito ocupados, vou lá conversar com eles, pedir uma “palavra amiga”. Digo que sofro de medo de voar e que gostaria de papear um pouco, para distrair. Até agora só tive ótimas experiências nesse quesito. Não somos gigantes nem sábios budistas, então ajudar e deixar ser ajudado é fundamental.

E tem uma “muleta” que não sai de meu bolso: o bom e velho remedinho para a ansiedade. Afinal, alguns auxílios são químicos, não é mesmo? Já ouvi por aqui alguns relatos do tipo “ah, mas tomar remédio?”, com ar de reprovação. Pois enquanto ele for necessário para que eu consiga voar, é com ele que vou. Eu tinha muito preconceito com fármacos de uso controlado. Desde a adolescência todo medicações para depressão e bipolaridade. Tinha vergonha de admitir isso. Hoje, falo numa boa: tomo remédio, sim. Minha saúde mental e meu bem-estar (e o daqueles que convivem comigo) em primeiro lugar. Sim, ainda há muito tabu e preconceito ao redor desse assunto, o que é horrível, pois afasta muitas pessoas que tem doenças mentais de um bom diagnóstico e tratamento. Por isso, falar sobre o tema de forma clara e sem rodeios é um passo importante para a normalização de casos assim.

Ah, outra coisa que venho tentado mudar em minha vida: não ser tão rígido comigo mesmo. Incorporar a palavra “flexibilizar” em meu dicionário da vida. Nessa viagem à Europa que citei acima, em outubro, eu estava tentando dar um foco maior à alimentação. Comer quantidades menores nas refeições e ficar atento à qualidade do que ingeria. Mas mandei pro espaço esse objetivo durante os voos e esperas em aeroportos. Me entupi de batata frita, chocolate, bolos e afins (até lasanha de microondas trash rolou em um voo da Ryanair). Ora, se eu fico nervoso nesses momentos e a comida me acalma, vou me privar desse conforto? Claro que não. Seguir a ferro e fogo algo, sem negociar com cada situação particular, me parece algo não muito inteligente. É um detalhe que tenho dado mais atenção em minha vida pessoal.

 

Lasanha trasheira no voo da Ryanair entre Madrid e Brindisi, na Itália. Adoro comer nos voos

 

Outra coisa vital na vida é buscar conhecimento, da forma que for. Como tenho formação e experiência profissional em jornalismo, sempre fui atrás daquilo que precisava saber para minhas matérias, seja entrevistando especialistas ou lendo conteúdos em fontes confiáveis. Para quem sofre de aerofobia, a dica é de ouro: identifique quais são seus temores e leia, leia, leia. Eu mesmo morro de pavor da decolagem. Por isso, já pesquisei bastante sobre essa etapa do voo, o que faz um avião sair do solo, como a física atua etc. Aliás, uma das metas do rivotravel é justamente servir como fonte de informação para panicadas e panicados.

E, por fim, tenho aprendido a aceitar mais o elogios, algo que eu tinha muita, mas muita dificuldade mesmo. Quando alguém me parabenizava, eu costumava ficar sem graça ou pensar “ah, ela só quer me agradar”. Segundo relatos que já ouvi, parece que muita gente tem problema com isso, de receber respostas positivas. Por que somos assim? Óbvio que não vou sair me gabando, tipo: “nossa, sim, eu sou maravilhoso mesmo”. Mas respostas como “que bom que você gostou da matéria, eu também gostei, fiquei feliz ao fazê-la” ou mesmo um simples “muito obrigado” já são extremamente positivos. Somos exímios em reconhecer nossos defeitos e ficar martelando-os em nossas cabeças. Acho que ir pro lado oposto, ou seja, aplaudir (discretamente) nossas virtudes é, sim, uma bela…virtude!

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